Esses dias um homem desabafou comigo sobre o quanto se sentia angustiado por não conseguir entrar em um relacionamento que dure mais que 2 ou 3 semanas… E quando lhe perguntei por qual motivo esses relacionamentos acabavam, ele me ofereceu rapidamente inúmeras justificativas que claramente eram reais e dolorosas para ele, mas que, no fim, apontavam para o mesmo lugar, que posso resumir assim: “as mulheres não são verdadeiras e, por mais que as ame intensamente, eu acabo me decepcionando com todas elas. Elas não têm a minha profundidade.”
O motivo que torna alguém incapaz de se relacionar verdadeiramente com outra pessoa pode ter muitas camadas, e jamais poderá ser restringido a uma explicação geral. Porém, eu quero falar sobre 2 pontos que parecem atravessar muitas dessas camadas merecem ser vistos, pelo menos como reflexão.
Primeiramente, precisamos diferenciar “intensidade” de “profundidade”. É bem comum encontrar homens e mulheres que se dizem profundos — enquanto os outros são superficiais —, mas que, no fim, são apenas intensos. “Mas não é a mesma coisa?” Longe disso. Eu consigo facilmente ser intenso em uma piscina infantil, mas isso não a torna profunda, não é mesmo? O caos da intensidade pode servir apenas como uma ferramenta para que eu não enxergue a minha incapacidade ou pavor de me conectar realmente com alguém, para além da paixão inicial, que tem algo de infantil — e muitas vezes algo de necessário.
E o segundo ponto: a paixão necessariamente é uma projeção de algo do inconsciente. Ou seja, eu não vejo o outro verdadeiramente no começo do relacionamento. O que vejo é um reflexo dessas partes minhas das quais não tenho consciência e que se projetam no outro. E essas partes carregam em si algo de divino, de perfeito, de não humano, e é com essas características que inicialmente enxergo a pessoa com quem me relaciono. E é por isso que as paixões sempre têm data de validade — essas projeções não se sustentam perante o humano. O que o outro é de verdade contradiz em vários pontos aquilo que eu enxerguei no começo e que uma parte infantil minha continua querendo enxergar (talvez a perfeição desejada daquela mãe ou pai idealizados, por exemplo). E se eu não tenho maturidade para compreender isso e força para lidar com um humano de verdade, com características positivas e negativas, e com uma individualidade que não respeita aquilo que eu desejo infantilmente, eu encontrarei uma justificativa para me afastar.
Relacionamento amoroso adulto é o que é construído após as paixões e projeções, em uma relação real com o outro real, e não com minhas expectativas infantis.
Leandro Scapellato
